Na semana passada fomos assistir ao Pequeno Príncipe. Marido francês, logo, aqui em casa a obra de Saint-Exupéry tem cadeira cativa em nossa biblioteca.
O filme é lindíssimo. De emocionar todas as gerações. Da fotografia à mensagem, tudo impecável. Fiel ao livro? Nem tanto, mas sem dúvida alguma super atual e com uma mesma mensagem sensível e essencial para a sociedade de hoje. Um tapa na cara, sim, Um presta atenção que precisamos tomar antes que sacrifiquemos toda uma geração.
Se você ainda não assistiu, vá. Vá em família, porque mesmo trazendo questionamentos aparentemente bastante complexos para os pequenos, crianças e adultos, todos absorverão, a seu modo, o recado que o filme pretende nos passar.
O texto abaixo, assim como o filme, traz uma reflexão interessantíssima sobre a infância e os padrões impostos pela vida atual.
Portanto, se assim como nós, você também acredita que “o essencial é invisível aos olhos, e só se pode ver com o coração”, você e sua família merecem assistir ao Pequeno Príncipe.
Boa leitura e bom filme.
E falando em relações, conexão e família, que tal presentear seu filho ou sua afilhada com um presente diferente e criativo pra curtirem juntinhos? Cinema é uma delícia e nós sabemos direitinho como “embrulhar” esse passeio pra presente.
Um beijo
Andrea e Anna
Nas telas, Pequeno Príncipe questiona mercado e família
Ao traduzir para vida cotidiana valores do livro de Saint-Exupéry, animação de Mark Osbourne mostra-se ácida, diante de mundo marcado por egoísmo, cálculo e alienação por Lais Fontenelle — publicado 01/09/2015 16h36, última modificação 01/09/2015 17h22
O aviador do livro de Saint-Exupéry segue com destaque no filme “O problema não é crescer, mas esquecer”, ensina o Pequeno Príncipe. Quando tinha oito anos, sofri a primeira grande perda em minha vida. Meu primo mais novo, na época com três anos, foi levado por uma doença comum na infância, mas que para ele foi fatal. A catapora não marcou e feriu somente sua pele, mas toda a história de nossa família. Pedro nos deixou sem palavras e com saudades. Tinha personalidade forte, como todas as crianças da família, os cabelos de um loiro quase branco e uma risada tão contagiante como a do Pequeno Príncipe – personagem que me acolheu nesse momento de dor e me guiou em profundos ensinamentos baseados em valores humanos e não materialistas. Hoje, posso olhar para o céu e ouvir as estrelas para não esquecer de Pedro, do seusorriso e da infância que compartilhamos.
O livro O Pequeno Príncipe, do francês Antonine Saint-Exupéry, emociona e ajuda as pessoas a entender a essência da vida há mais de 70 anos. Foi traduzido para cerca de 250 idiomas e dialetos, e vendeu mais de 150 milhões de cópias em todo o globo. É há meio século o livro infantil mais vendido no Brasil, e somente no ano passado vendeu mais de 140 mil exemplares. Seu autor faleceu um ano após o seu lançamento, em 1943, numa missão da Segunda Guerra Mundial, sem poder dimensionar o alcance da obra.
O livro conta a singela história de amizade vivida por um aviador e um principezinho que mora no longínquo asteroide B612 e ama uma rosa. Quando o príncipe sai em viagem pela Terra, esbarra com o aviador encalhado num deserto e ali compartilham histórias e ensinamentos sobre as dores e as delícias de ser humano.
A animação homônima ao livro chegou às telas esse mês, dirigida pelo americano Mark Osbourne, e traz uma nova e igualmente bela narrativa para esse clássico da literatura infanto-juvenil.
Desta vez, quem fica amiga do Aviador, hoje um velhinho, é uma garotinha de olhos curiosos, abandonada pelo pai e confinada pela mãe numa casa cinza. Com tarefas obsessivamente calculadas por uma mãe ausente, a menina tem uma rotina espartana durante as férias de verão, para conseguir vaga numa escola de renome que promete futuro de sucesso.
Sem tempo para dedicar-se ao ócio, aos amigos, ao contato com a natureza ou ao exercício de sua criatividade, a menina experimenta os dias sozinha e assim vai perdendo a essência da infância, até ser resgatada pelo vizinho excêntrico – um velhinho aviador que lhe conta a história do Pequeno Príncipe e com quem acaba por passar suas férias.
Seus pais não têm tempo de cuidar dela – como muitos, atualmente, que terceirizam os cuidados dos filhos para babás, creches ou tablets. O pai da protagonista vive longe, trabalha muito e mantém contato com ela somente no aniversário – por meio de um mesmo presente que envia todo ano, com um cartão que nada diz e ela tristemente coleciona. A mãe também trabalha demais e não a escuta, “adultizando” essa menina para ser seu par – e dizendo que faz isso para lhe garantir o futuro, sem perceber que assim lhe arranca o presente.
A trama principal do ‘Pequeno Príncipe’ de Osbourne gira em torno da pequena garota de infância cinza (Foto: Divulgação)
Triste retrato da infância de hoje, abandonada e afastada de sua essência em meio a tantas atribuições do universo adulto.
Fui assistir ao filme em família e fiquei feliz ao perceber que a amizade e os ensinamentos compartilhados entre o adulto e a criança ainda emocionam todas as gerações. A meu lado um pai com a filha no colo derramavam lágrimas que mostram haver saída para a vida cinza e planejada que a maioria de nós experimenta nos grandes centros urbanos.
O filme emociona e faz refletir sobre os valores que aprisionam as crianças contemporâneas numa infância igualmente cinza e solitária, com a agenda repleta de atividades supostamente desempenhadas para lhes garantir um bom lugar na Terra – a mesma que estamos destruindo pelos padrões de consumo e produção que adotamos.
Aparentemente perdidos na árdua e deliciosa tarefa de cuidar dos filhos, pais e mães da atualidade acabam recorrendo às promessas que o mercado lhes oferece. Tenho sido com frequência chamada a falar nas escolas sobre o tema da desaceleração na rotina das crianças, e minha fala debruça-se sobre a importância de respeitarmos a infância e seu tempo: de encantamento e conexão, em que contemplar e imaginar são atividades essenciais na construção de significados para o mundo real.
É preciso desacelerar e desconectar para entrar em contato com a criança que fomos e com as que estão ao nosso lado. Rever nossas urgências e o que é realmente importante para promover uma infância plena. Crianças não são feitas para ser criadas em bolhas. Elas precisam se relacionar, cair para aprender a levantar, perder para aprender a sonhar e elaborar. Precisam de histórias vividas e narradas para se lembrar. E não precisam, para ser felizes, de objetos e atividades que as cansem para desligar-se à noite. Não precisam de um coach para aprender a brincar – sim, parece que estes personagens existem!
Crianças precisam de muito pouco para crescer de forma saudável e se tornar adultos melhores. Precisam de tempo e espaço para brincar e se relacionar entre pares, com adultos e com a natureza. E nós, adultos, temos o dever e a responsabilidade de oferecer a elas o que é realmente essencial – embora invisível aos olhos.