Não existe educação de qualidade sem respeito

Depois de passar um dia inteirinho ouvindo alunos, educadores e profissionais de diversas áreas da educação em um evento superbacana onde estive esta semana, minha conclusão é de que ANTES (e mais importante) de aprender história, matemática e português, ou ter laboratório de física ou robótica na escola, nossas crianças precisam aprender sobre diversidade, escuta, cidadania, colaboração e, sobretudo, RESPEITO.

Lucas é um garoto de 18 anos, homossexual e que gosta de se vestir com roupas femininas e de usar maquiagem. Em sua fala embargada e entristecida, é fácil perceber o sofrimento e o peso de ser destratado e humilhado diariamente pelos colegas da escola (e pela omissão dos professores) por não estar no padrão. Segundo ele, o que falta nas pessoas é RESPEITAR os outros e suas escolhas.

Ivonete é professora há mais de 25 anos na rede estadual. Nasceu em Sp, mas é de origem nordestina. Conta que foi a primeira da sua família a fazer uma faculdade e escolheu ser professora para que pudesse contribuir com os estudos de outras crianças como ela. Mesmo após anos de estrada, diz que luta até hoje contra o preconceito que sofre em razão do “sotaque arrastado”. Sua missão como educadora é ensinar aos alunos que RESPEITEM uns aos outros e, aos que, assim como ela também tem o “sotaque arrastado”, não tenham vergonha de suas origens.

Jéssica é negra, da periferia, aluna do curso de pedagogia e faz estágio em uma escola particular de educação infantil. Diz que trabalhar em um ambiente onde ela é a única pessoa negra é essencial para que as crianças brancas aprendam a respeitar as diferenças. Quando criança, sofreu demais com a falta de representatividade e com a vergonha que sentia em razão do seu cabelo e da sua cor. Sua luta, como educadora, é fazer com que todas as crianças se sintam representadas e RESPEITADAS.

Foram relatos como este, do cotidiano real do “chão da escola”, que mais me chamaram a atenção durante o evento DIÁLOGOS, que aconteceu na última segunda feira (22/10) e do qual tive o prazer e a honra de participar.

Inteirinho organizado por mulheres voluntárias (dentre as quais eu me encaixo) do Comitê de Educação do Grupo Mulheres do Brasil, o evento tinha como proposta uma escuta atenta e verdadeira aos desafios e conquistas da educação pública brasileira, pelas vozes de quem faz: alunos, professores e gestores.

 

Pra nossa surpresa e alegria, colhemos muito mais do que isso. Ouvimos, sim, sobre conquistas e desafios, e nos surpreendemos. Ouvimos também sobre caminhos e possíveis soluções e nos enchemos de esperança.

O que mais me surpreendeu, no entanto, foi o sentimento de que a maior ausência na nossa educação não é a de investimento ou de material didático. A maior ausência é a de valores. E isso, se aplica à educação pública e à privada. Dentro e fora da escola.

Quero dizer que há muita coisa incrível sendo feita na educação pública brasileira. Este evento, como disse, foi um sopro de esperança em tempos tão incertos e sombrios. Ouvimos gente muito boa, batalhadora e pronta pra transformar a realidade por meio do conhecimento. Mas ainda falta muito e esse muito começa no RESPEITO.

  • RESPEITO ao direito de TODAS as crianças a uma educação de qualidade;
  • RESPEITO aos professores e ao seu direito a uma formação contínua e integral;
  • RESPEITO à diversidade como um todo;
  • RESPEITO aos espaços comuns.

Humberto é Cientista Político e Professor Universitário. Em sua fala, uma reflexão superimportante: como em pleno século XXI, a escola ensina tanto sobre técnicas e conteúdo, e deixa os estudantes tão órfãos de conceitos básicos como ética, cidadania e direitos?

Nas palavras do Professor, sem tais conhecimentos, muitos estudantes chegam a universidade sem a menor ideia de como trabalhar de forma colaborativa ou de quais são suas obrigações enquanto cidadãos.

Achei isso grave!

Há algumas semanas, uma matéria da BBC trouxe a informação de que inspiradas nos Japoneses, escolas britânicas estão ensinando os alunos a contribuírem com a limpeza do espaço. Achei a iniciativa fantástica. Que lição de cidadania, de colaboração e de respeito ao espaço comum.

No mesmo instante comecei a imaginar uma escola brasileira propondo algo parecido. Aposto que não demoraria um dia para que famílias indignadas comparassem a prática a trabalho escravo ou abuso infantil.

Sem sequer nos darmos conta, estamos perdendo a chance de ensinar nossas crianças coisas muito mais valiosas do que logaritmo ou raiz quadrada, ou ainda, como se tornarem experts em robótica antes dos 12 anos para que sejam os próximos “Steve Jobs”.

Gosto muito do tema educação e procuro me informar bastante a respeito. Olhando pra nossa história, e especialmente pro momento em que estamos vivendo, tenho estado cada vez mais convencida de que antes de nos preocuparmos em lotar as agendas dos nossos filhos com aulas que vão de mandarim à esgrima, aos 3 anos de idade, deveríamos estar preocupados em lhes ensinar sobre ética, colaboração, respeito e amor ao próximo.

Penso que “bom dia”, “por favor” e “obrigado” deveriam ser as primeiras palavras a serem ensinadas a uma criança. E só depois deveríamos nos preocupar em ter crianças bilíngues ou em qual universidade elas estudarão.

Temos muitos desafios pela frente, é verdade. Mas o maior deles é o desafio de criar seres humanos melhores, mais empáticos, sensíveis e respeitosos. E esse é um desafio de todos nós, pais, mães, educadores e sociedade. Só assim acredito que os inúmeros “Lucas”, Ivonetes” e “Jéssicas” do nosso país passarão a se sentir, de verdade, parte do nosso todo.

Luiza Helena Trajano, idealizadora do Grupo Mulheres do Brasil e frequentadora assídua dos eventos promovidos por todos os Comitês, finalizou este dia incrível dizendo que uma pesquisa recente apontou que empresas contratam mais de 90% dos funcionários por suas capacidades técnicas e os mandam embora pela ausência de competências comportamentais, como falta de ética, respeito ao próximo e capacidade de trabalhar em equipe.

Chocante, não é mesmo?

Repensemos, então, com urgência a educação na escola e fora dela. Façamos todos a nossa parte pelo futuro profissional e pessoal das nossas crianças.

 

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Eu sou Andréa Tavares de Lima, mãe do Bernardo e da Laura e apaixonada por gente, comportamento humano, desenvolvimento infantil, entretenimento e cultura, educação, inovação, viagens e vinho! Sou advogada por formação e empreendedora de coração. Escolhi o Direito pela paixão por escrever e saí dele pela paixão por criar. Criar filhos, histórias, soluções (criativas) para os mais variados problemas, oportunidades e empresas (já criei 2!). Amo escrever e  escrever é uma das minhas maneiras preferidas de me relacionar comigo e com o mundo.

 

1 Comment

  1. Regina says: Responder

    Adoro ler seus artigos. Vc é inteligente e se coloca de forma clara e lucida em seus textos. Continue nos brindando com sua forma unica de nos trazer as informacoes atualizadas sobre criancas, sua formacao e o mundo que as aguarda. Gratidao

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